saiba mais sobre a Biotécnica
através do nosso blog.
1. Contextualização
Em dezembro de 2019, o mundo foi surpreendido com uma nova infecção sem agente etiológico definido situada em Wuhan, China. Essa infecção causava uma pneumonia que levava a rápida depreciação da função respiratória, evoluindo para quadro de síndrome respiratória aguda (SARS, do inglês Severe Acute Respiratory Syndrome) (1). No mês de janeiro de 2020, foi descrito que o agente etiológico da relatada pneumonia era da família Coronaviridae, recebendo a patologia associada o nome de coronavirus disease (COVID-19) e o agente etiológico severe acute respiratory syndrome coronavirus 2 (SARS-CoV-2) (2, 3). Nos meses de janeiro a março, o vírus se espalhou pelo mundo, levando a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar no dia 11 de março de 2020, estado de pandemia causada pelo SARS-CoV-2 (4). O que colaborou para que o vírus causasse uma pandemia é o fato dele ser transmitido pelo ar, além de que pessoas infectadas assintomáticas também podem transmiti-lo (5). Uma vez dentro do organismo, o vírus promove a interação com a membrana plasmática da célula do organismo humano através de uma glicoproteína de superfície denominada “spikes” que interage com o receptor da enzima conversora de angiotensina 2 (ECA2), para que possa entrar com seu material genético dentro da célula e iniciar o processo de replicação viral (6). O diagnóstico conclusivo da infecção pelo SARS-CoV-2 é realizado através da técnica de reação em cadeia da polimerase em tempo real (RT-PCR, do inglês Real Time – Polimerase Chain Reaction) (7), mas por ser uma técnica onerosa e que despende de recursos escassos em países como o Brasil, vários pacientes permanecem sem o correto diagnóstico. Deste modo, o objetivo deste trabalho é avaliar possíveis achados laboratoriais descritos na literatura que possam corroborar com a clínica do paciente, afim de facilitar o diagnóstico presuntivo da infecção causada pelo SARS-CoV-2.
2. Exames para diagnóstico da infecção do SARS-CoV-2
2.1 -Testes moleculares:
Segundo protocolo da OMS, os testes de amplificação de ácido nucleico (NAAT, do inglês Nucleic Acid Amplification Teste), como a técnica de RT-PCR, devem ser utilizados para diagnosticar a infecção causada pelo SARS-CoV-2 (8). Assim, a entidade preconiza que pacientes provenientes de áreas com circulação conhecida do vírus, como é o caso do Brasil, são considerados positivos quando apresentarem resultado positivo para a amplificação de apenas uma região alvo do RNA viral.
Para os testes de RT-PCR, o Centro de Controle de Doenças (CDC, do inglês Centers for Disease Control and Prevention), preconiza que as amostras devem ser coletadas com o uso de swab nas regiões de orofaringe e nasofaringe (9). A recomendação do CDC é baseada em uma ampla literatura, que demonstra com clareza que amostras positivas oriundas dos sítios referidos acima, possuem uma excelente assertividade quanto à infecção causadas por vírus da família Coronaviridae (10-12).
Buscando outras amostras que possam ser utilizadas em testes NAAT, o estudo de Xie et. al., comparou os resultados obtidos através de amostras de fezes, urina e sangue com os resultados obtidos por swab de orofaringe. Ainda que o trabalho tenha avaliado uma população positiva de apenas 9 pacientes, o estudo demonstrou que apenas as amostras de fezes tiveram uma boa correlação com os resultados obtidos por swab de orofaringe, sendo encontrado a mesma positividade em 8 dos 9 pacientes analisados. Amostras de sangue e urina não apresentaram correlação com os resultados das análises de swab de orofaringe (13).
2.2 – Exames sorológicos
Os anticorpos produzidos frente a infecção causada pelo SARS-CoV-2 começam a ser observados após os sintomas, sendo a imunoglobulina M (IgM) detectável após o sétimo dia de infecção e a imunoglobulina G (IgG) após o décimo quarto dia do início da infecção, conforme representado na figura 1.
Adaptado de Dyazime (14).
Dado o esquema representado na figura acima, podemos avaliar a progressão da doença nos pacientes associando os resultados da análise de antígeno e anticorpos. As possibilidades diagnósticas estão demonstradas na tabela 1.
2.3 – Exames convencionais com valor preditivo para infecção por SARS-CoV-2:
O Ministério da Saúde, através da Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde, publicou no dia 06 de abril desse ano um documento intitulado “Diretrizes para diagnóstico e tratamento da COVID-19”, onde é possível encontrar uma série de revisões sistemáticas utilizando o Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) (15). Baseado nos artigos selecionados através dessas revisões, o documento sugere que pacientes com suspeita de infecção pelo SARS-CoV-2 podem ser avaliados com determinados testes laboratoriais que, ainda que não tenham especificidade para diagnosticar a infecção, auxiliem no diagnóstico diferencial. Os testes, bem como a interpretação dos seus respectivos resultados, estão compilados na tabela 2.
3. Considerações sobre o cenário diagnóstico:
Ainda que os testes moleculares sejam considerados padrão ouro para o diagnóstico da infecção causada pelo SARS-CoV-2, a baixa disponibilidade dos testes, aliada à centralização em alguns laboratórios de referência, leva a várias complicações pré-analíticas que podem implicar na qualidade do resultado. Um estudo italiano enumerou várias possibilidades de erro que podem acontecer durante o processo que compreende desde a coleta do material para a análise molecular, até a acurácia do exame, destacando que a estocagem da amostra deve ser rigorosamente controlada pois é uma das principais fontes de erro do processo (16). A OMS, através do guia intitulado “Laboratory testing for coronavirus disease (COVID-19) in suspect human cases”, apresenta instruções para o armazenamento de diversas amostras, sobretudo para amostra coletada por swab de nasofaringe ou orofaringe, que deve ser armazenada a -70oC quando a amostra irá demorar mais de 5 dias para ser analisada (17).
A sorologia tem papel fundamental nesse contexto, sobretudo por ser mais acessível do que as técnicas moleculares, tendo como principal forma de apresentação os testes rápidos. Contudo, várias reportagens têm sido vinculadas sobre falhas em testes rápidos, levando o Ministério da Saúde a elaborar um documento onde faz um compilado de dados como sensibilidade, especificidade e precisão extraídos da instrução de uso dos diversos testes que foram registrados junto à ANVISA até a primeira quinzena de abril de 2020 (18). É possível avaliar que há variação entre a performance dos testes, ainda que, no geral, a sensibilidade dos testes sorológicos seja superior a 85% e a especificidade, superior a 94%. Como destacado pelo documento, baixos percentuais de sensibilidade podem levar a resultados falsos-negativos, implicando na falta de diagnóstico de um paciente verdadeiramente acometido pela COVID-19.
Como a oferta dos testes de biologia molecular e sorologia estão escassos em diversos países, incluindo o Brasil, há um grande esforço na busca por outros exames que possam predizer a infecção pelo SARS-CoV-2 (19, 20). Como demonstrado na tabela 2, algumas alterações em analitos tem sido descrito na literatura podem auxiliar quando agregados aos achados radiológicos e a clínica do paciente. Por se tratarem de testes inespecíficos, descartar outras causas como a infecção pelo vírus Influenza é primordial para aumentar o valor dos resultados dos testes.
A elevação dos valores de ureia e creatinina podem indicar uma redução da taxa de filtração glomerular por depreciação da função renal, sendo um achado laboratorial que indica maior possibilidade do paciente de evoluir com um prognóstico ruim, podendo chegar a óbito, conforme demonstrado por Cheng et. al. (21). Associado à alteração nos valores de ureia e creatinina, a elevação dos níveis de bilirrubina, a alteração na coagulação refletida por maiores tempos de TP e TTPa, a inflamação demonstrada pelos valores de procalcitonina, proteína C reatina e desidrogenase láctea possuem grande valor de predição de piora no quadro do paciente quando avaliados em conjunto (22, 23).
A dosagem de dímero-D, ainda que também não seja amplamente disponível no Brasil, é mais acessível que a técnica de RT-PCR e é associada a formas mais graves de infecção pelo SARC-CoV-2, sobretudo porque alguns pacientes podem desenvolver tromboembolismo pulmonar (24, 25). A dosagem de dímero-D aumentada é correlacionada com a diminuição nos tempos de TP e TTPa, que indica pior prognóstico para o paciente (26). A exemplo do dímero-D, a Troponina I ultra sensível indica um pior prognóstico, sobretudo porque está associada ao acometimento cardíaco pela COVID-19 (27).
As alterações no hemograma são observadas com leucopenia, linfopenia, plaquetopenia e neutrofilia. Essas variações na contagem celular, aliada ao aumento de citocinas inflamatórias como a interleucina-6, também estão associadas com um pior prognóstico do paciente (28). O achado de linfopenia é incomum por se tratar de uma infecção viral, mas o trabalho de Tan et. al. propõe quatro hipóteses para explicar a linfopenia, sendo que a primeira de que o SARS-CoV-2 infecta o linfócito e por isso diminui sua quantidade; a segunda de que o vírus ataca órgãos linfoides como o timo e o baço; a terceira de que a desordem nas citocinas levam à apoptose dos linfócitos; a quarta de que há a inibição do metabolismo dos linfócitos (29).
Conclusão
Devido à escassez de testes moleculares e sorológicos para confirmação da infecção do novo SARS-CoV-2, outros testes laboratoriais podem ter valor quando agregados entre si e a achados radiológicos e à clínica apresentada pelo paciente. No momento onde os recursos então em falta, é de vital importância que o diagnóstico seja discutido entre todos os profissionais envolvidos no cuidado ao paciente, para que as variáveis possam ser minimizadas e o diagnóstico presuntivo seja o mais próximo da realidade.
Referências
Bolacha | Duração | Descrição |
---|---|---|
cookielawinfo-checbox-analytics | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Analytics". |
cookielawinfo-checbox-functional | 11 months | The cookie is set by GDPR cookie consent to record the user consent for the cookies in the category "Functional". |
cookielawinfo-checbox-others | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Other. |
cookielawinfo-checkbox-necessary | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookies is used to store the user consent for the cookies in the category "Necessary". |
cookielawinfo-checkbox-performance | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Performance". |
viewed_cookie_policy | 11 months | The cookie is set by the GDPR Cookie Consent plugin and is used to store whether or not user has consented to the use of cookies. It does not store any personal data. |